
PEC do calote ainda pode perder
A primeira votação da PEC 23 terminou com uma vitória muito apertada dos caloteiros. Este fato recente nos deixa algumas lições para a próxima batalha decisiva pela saúde fiscal não apenas do Brasil como nação, mas como destino de investimentos e geração de emprego e renda.
O assunto é duplamente relevante para a reputação do país, tanto pelo respeito às decisões judiciais de onde vêm as dívidas quanto pelo equilíbrio fiscal necessário para manter a estabilidade do governo brasileiro. Mudar as regras para os precatórios em nome de financiar um programa assistencialista novo é quebrar uma reputação já manchada por outros fatores recentes.
O que é e o que faz a PEC
A PEC 23 abre a possibilidade de um limite para os pagamentos obrigatórios que decisões judiciais impõem ao governo federal. Sempre que uma pessoa ou empresa processam o governo e ganham a causa sem qualquer possibilidade do governo recorrer essa dívida se transforma em precatórios. Todos os anos o governo federal tem pagamentos obrigatórios destes precatórios para honrar as dívidas destas decisões judiciais, estes pagamentos para serem feitos em 2022 somam R$ 89 bilhões de acordo com Guedes.
Caso a proposta seja aprovada, a expectativa é que crie uma folga de R$ 91,6 bilhões no orçamento de 2022. Destes R$ 91,6, R$44,6 bilhões são dos precatórios que poderão ser parcelados para anos futuros enquanto R$ 47 bilhões são da correção do teto de gastos que está incluída na mesma PEC.
Voto de fora na aprovação da PEC
Sempre que um projeto importante está para ser votado os parlamentares visitam uns aos outros, conversando e fechando acordos, buscando apoio para a aprovações ou vetos. Isto é o comum e esperado de acontecer em qualquer câmara municipal, assembleia estadual ou o congresso nacional, mas o que Lira fez pela PEC 23 foi um pouco além.
Uma semana após retornar aos trabalhos presenciais no plenário da câmara a mesa diretora aprovou ato que permite o voto remoto para quem está em “Missão autorizada pela Câmara”. A medida faz sentido quando se pensa nos avanços tecnológicos que permitem o trabalho remoto, mas o único fator que fez essa decisão existir foi a vontade do presidente da câmara de aprovar o projeto, garantindo que seus aliados em viagem pudessem ajudar na aprovação. A medida provavelmente não aconteceria se os parlamentares em viagem oficial fossem contra a proposta, o que deixa clara a instabilidade da proposta e o pouco apoio que tem, dentro dos critérios de exigência para uma emenda à constituição.
Ainda serão necessárias três votações antes de Bolsonaro poder ter o prazer de aprovar sua pedalada fiscal em favor de seu “Auxílio Brasil”, o 2º turno na câmara e os dois turnos no senado. Esses serão momentos para explorar esta instabilidade e barrar a PEC.
O fator político
A urgência em adequar o orçamento e liberar margem para gastos não obrigatórios é o ano eleitoral de 2022, vital para a reeleição presidencial e dos mandatários que compõem o centrão. Com as diversas mudanças de regras eleitorais que começarão a se valer em 2022 duas coisas se fazem necessárias para garantir vitórias, estratégias de qualidade e recursos. Qualquer estratégia precisa ser baseada nas regras do jogo e quando as regras mudam o próprio conceito de estratégia de qualidade muda junto. O exemplo das municipais de 2020 e como muitas derrotas vieram mesmo para candidatos com recursos se explicou pela falta de preparo para lidar com os efeitos das novas regras eleitorais.
Nas votações futuras que a PEC 23 precisa enfrentar ela encontrará resistências de grupos políticos que precisam enfraquecer o presidente Bolsonaro e reduzir o orçamento disponível para as negociações políticas com sua base no congresso e para seu “Auxílio Brasil”. Ciro Gomes já anunciou suspensão de sua pré-campanha à presidência para garantir votos no PDT contra a PEC.
Qualquer candidato de fora do eixo Bolso-Lulista precisa agir para impedir este provável segundo turno entre o atual e o ex-presidente, movimentações neste sentido devem surgir também do PSDB, Podemos, Cidadania e outros partidos com interesses presidenciais próprios.
Esta tendência aponta para a provável derrota da PEC em votações futuras, mas não significa que Bolsonaro irá parar de tentar garantir. O presidente está motivado a usar a máquina para garantir sua reeleição e gastará o que for preciso, mesmo que no caminho destrua as finanças e a credibilidade do país.
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"O poeta é assim: tem, para a dor e o tédio, Um refúgio tranquilo, um suave remédio. És tu, casta poesia, ó terra pura e santa! Quando a alma padece, a lira exorta e canta; E a musa que, sorrindo, os seus bálsamos verte, Cada lágrima nossa em pérola converte." MACHADO DE ASSIS
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